O que Gurdjieff chama de “ciência objetiva” usa a analogia musical para descrever um universo composto por uma cadeia de energias, da oitava mais baixa à mais alta. Podemos falar aqui de energias plurais. Cada energia é transformada à medida que sobe ou desce, de modo que pode ser mais grossa ou mais fina, dependendo de sua posição na escala. Em cada nível, uma energia corresponde a um grau de inteligência, e a própria consciência, flutuando em uma ampla gama de vibrações, é o que caracteriza a experiência humana.
Gurdjieff não apenas fala de um movimento de energia capaz de se elevar a novos graus de intensidade, mas também afirma a realidade de um nível final — um absoluto de qualidade pura. Na direção oposta, as energias sutis descem para encontrar e interagir com as energias que conhecemos. Quando essa mistura do grosseiro e do sutil ocorre, mudam os pensamentos, sentimentos e atitudes de uma pessoa, mudam o próprio significado de suas ações e a influência que elas exercem sobre o mundo ao seu redor.
O que caracteriza a vida comum é o fato de ela operar em um campo de energias cujos limites são estritamente circunscritos e, para usar a metáfora musical, que ela só pode se mover para cima e para baixo em um pequeno número de escalas. Sob essas condições, o nível de nossa consciência é baixo, o poder de nosso pensamento é limitado e as energias disponíveis alimentam uma visão e uma motivação estreitas.
Gurdjieff mostra que há dois pontos precisos em cada escala em que um movimento em pleno desenvolvimento é interrompido ou, mais precisamente, está situado em um intervalo que só pode ser atravessado pela introdução de uma nova vibração que ofereça exatamente a qualidade e o impulso necessários. Caso contrário, como nada no universo pode permanecer estável, a energia crescente inevitavelmente voltará ao seu ponto de partida.
Essa é uma noção radical e surpreendente: significa que toda energia e, portanto, toda ação humana, só pode se elevar, por iniciativa própria, até um determinado ponto, como a flecha lançada em direção ao céu que, tendo esgotado o ímpeto que a impulsiona, atinge o ponto mais alto e é forçada a dobrar sua trajetória e cair de volta à terra. No entanto, se o ponto crucial no qual a energia inicial começa a enfraquecer for observado com precisão, nesse exato momento pode ocorrer o que Gurdjieff chama de “choque”, ou seja, a introdução consciente de um impulso apropriado para que o movimento rompa a barreira e possa continuar seu desenvolvimento ascendente. Essa imagem nos ajuda a entender por que os esforços humanos caem em desuso, por que os impérios entram em decadência, por que as melhores previsões se revelam erradas e por que imensas revoluções “retrocedem” e traem seus grandes ideais. As mesmas leis mostram que uma determinada força, aplicada com precisão, poderia ter evitado esse retorno ao zero. Mas o princípio básico raramente é reconhecido, e ficamos culpando os outros e a nós mesmos com amargura e frustração.
Se, no momento vital, as energias em ação puderem entrar em um relacionamento com energias de uma ordem diferente, ocorrerá uma mudança de qualidade que pode levar a experiências artísticas intensas e transformações sociais. Mas o processo não para por aí: ele continua a ser nutrido por energias mais elevadas, e a consciência se eleva a um nível mais alto que transcende a arte e pode, por sua vez, levar ao despertar espiritual — possivelmente até à pureza absoluta, ao sagrado; pois o próprio sagrado pode ser entendido em termos de energias, mas de uma qualidade que nossos instrumentos não conseguem registrar.
Em todas as tradições esotéricas, encontramos a distinção entre um nível superior e um inferior, entre o espírito e o corpo. Gurdjieff coloca essa divisão em um contexto muito diferente. O homem não nasce com uma alma pronta; ele nasce incompleto. A alma é material como o corpo, a matéria é energia e o próprio homem, por meio de esforço consciente, pode desenvolver substâncias mais finas e mais fortes em seu corpo. Mas isso não é fácil. Nem a piedade nem a determinação são suficientes, porque mesmo um alto grau de compreensão pode ser parcial e se perder novamente.
Gurdjieff analisa a condição humana com uma precisão devastadora. Ele mostra como as pessoas são condicionadas desde a mais tenra infância e como suas vidas se desenvolvem de acordo com uma longa cadeia de reações que nada pode interromper. Reações que, por sua vez, dão origem a todo um fluxo de sensações e imagens, que nunca é a realidade que afirma ser; é apenas a interpretação de uma realidade que seu fluxo contínuo o condena a ocultar.
Todo fenômeno surge de um campo de forças: cada pensamento, cada sentimento, cada movimento do corpo é a manifestação de uma energia específica. No entanto, no ser humano, cada manifestação tende a “inchar” e a sobrepujar a outra. Essa incessante “alternância” entre mente, sentimento e corpo produz uma gama flutuante de impulsos, cada um dos quais, enganosamente, se afirma como “eu”. Se olharmos atentamente, não encontraremos nenhuma decisão constante, nenhuma intenção verdadeira, mas uma rede caótica de contradições na qual o ego encontra sua ilusão de vontade e independência.
A transformação do ser humano só pode começar quando as fontes que Gurdjieff chama de “centros”, das quais brotam movimentos, sentimentos e pensamentos, deixarem de produzir explosões espasmódicas e desordenadas de energia e começarem a funcionar juntas em harmonia.
Então, pela primeira vez, surge uma nova qualidade, que Gurdjieff chama de “presença”. À medida que ela cresce, a matriz de nossas reações e desejos, que chamamos de ego, se dissolve e, no centro de nossa estrutura automática de comportamento, forma-se um novo espaço onde a verdadeira individualidade pode aparecer.
O homem, entretanto, não pode se transformar quando está sozinho. Ele está “trancado” em seu próprio condicionamento, vive em seu próprio alcance e permanece bloqueado pelas mesmas lacunas intransponíveis. Ele precisa de ajuda. É necessário um guia, e há muitas áreas que exigem sua atenção. Alguns ensinamentos visam destruir o domínio do corpo, outros buscam elevar as emoções à rendição extática, outros trabalham para esvaziar a mente. Em muitos desses ensinamentos, a presença do guia é suficiente para elevar os alunos a novos estados. O ensinamento de Gurdjieff trabalha simultaneamente em todos os aspectos da psique: na mente, nos sentimentos e no corpo. Ele rejeita a passividade que poderia resultar da dependência ingênua do professor.