G mim mesmo

GURDJIEFF TERMOS — CONCEITO DE «MIM MESMO»

Segundo Richard Defouw, em RBN III-48, G apresenta um modelo do ser humano em termos de um coche (alegoria antiga já no Katha Upanixade e em Platão). Neste modelo, o coche, enquanto veículo, corresponde ao corpo da pessoa, o cavalo atado ao coche corresponde ao sentimento da pessoa, e o cocheiro dirigindo o cavalo e assim o coche também, corresponde à mentação da pessoa. Cada uma destas três partes corresponde à um «centro» ou «cérebro»: o corpo é considerado não enquanto matéria que se dissolve quando morremos, mas enquanto seu «centro instintivo-motor-sexual», os sentimentos são da província de um centro próprio deles, o «centro emocional», e a mentação é efetuada no centro pensante, «centro intelectual». Assim cada pessoa tem três centros, e é o que B em RBN chama «ente tricerebral». Nos FRAGMENTOS há uma descrição mais detalhada, onde os cérebros de uma pessoa são identificados como compondo uma estrutura total de sete centros: centro intelectual, centro emocional, centro motor, centro instintivo, centro sexual, centro emocional superior e centro intelectual superior.

G tem muito a dizer através dessa alegoria do «ente-coche» no capítulo RBN III-48, fixando sua descrição no corpo planetário e nas inadequadas relações entre os três centros que o constituem. Porém o núcleo de sua apreciação crítica do ente humano é com aquele que o coche transporta, aquele que está em sua cabine, determinando destino e direção a todo conjunto através do cocheiro. Assim G considera o ser humano como «real» ou «entre aspas», de acordo com a natureza «daquele» na cabine:

No primeiro caso, aquele do homem real, o passageiro é o proprietário do coche, e no segundo caso, ele é simplesmente o primeiro ocasional transeunte que, como o na fretagem de «taxis», está continuamente sendo trocado. (RBN III-48)

Devido ao sentido de mim mesmo que todos possuímos, cada um de nós se classificaria como um ser humano «real» de acordo com esta definição. Mas G afirma que este sentido de mim mesmo é uma ilusão. De fato, não há dentro de nós uma fonte singular da qual nossas manifestações emanem e nenhuma entidade que inicie e receba percepções de nós mesmos e do mundo exterior. Ao contrário, cada um de nós é uma coleção de pequenas personalidades que são chamadas — agora uma, agora outra — em resposta a condições cambiantes. Porque a pequena personalidade ativa, teu «califa», a qualquer dado momento considera a si mesmo ser um «Eu», a sensação de «Eu» é estável embora o «Eu» ele mesmo não o seja. Em resumo, cada um de nós é o que G chama um «homem entre aspas», mas falha em ver esta realidade precisamente por causa das limitações que acarreta.

Assim imediatamente sentimos a profundidade da análise de G da condição humana como apresentada em «Um Criticismo Objetivamente Imparcial da Vida do Homem» (primeiro título dos RELATOS DE BELZEBU). Mas G oferece mais do que uma crítica, pois assegura que é possível, com uma justa condução e trabalho duro, para um humano entre aspas transformar a si mesmo em um humano real. Ou seja, é possível ter na cabine de seu coche e servi-lo, o Eu que é seu legítimo proprietário. Esta condição é aquela que seu ensinamento quer proporcionar e que depende fundamentalmente de uma atenção e mudança de presença em ser-aí que implica em vários aspectos, mas dos quais se destaca a «sensação da totalidade de mim mesmo».



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